segunda-feira, 27 de agosto de 2012

DOUTRINA DA PRESERVAÇÃO DE TODAS AS COISAS

1. BASE DA DOUTRINA DA PRESERVAÇÃO. A prova da doutrina da preservação é direta e por dedução.
a. Prova direta. A divina preservação de todas as coisas é clara e explicitamente ensinada em diversas passagens da Escritura. As seguintes passagens são apenas algumas das muitas que poderiam ser mencionadas: Dt 33.12, 25-28; 1 Sm 2.9; Ne 9.6; Sl 107.9; 127.1; 145.14, 15; Mt 10.29; At 7.28; Cl 1.17; Hb 1.3. Muito numerosas são as passagens que falam do Senhor preservando o Seu povo. Exemplos: Gn 28.15; 49.24; ex 14.29, 30; Dt 1.30, 31; 2 Cr 20.15, 17; Jó 1,10; 36.7; Sl 31.20; 32.6; 34.15, 17; 37.15, 17, 19, 20; 91.1, 3, 4, 7, 9, 10, 14; 121.3, 4, 7, 8; 125.1, 2; Is 40.11; 43.2; 63.9; Jr 30.7, 8, 11; Ez 34.11, 12, 15, 16; Dn 12.1; Zc 2.5: Lc 21.18; 1 Co 10.13; 1 Pe 3.12; Ap 3.10.
b. Prova por dedução. A idéia da preservação divina interfere-se da doutrina da soberania de Deus. Esta só se pode conceber como absoluta; não seria absoluta, porém, se existisse ou acontecesse alguma coisa independentemente da Sua vontade. Só pode ser sustentada com a condição de que todo o universo e tudo que nele há é em seu ser e em sua ação absolutamente dependente de Deus. Infere-se também do caráter dependente da criatura. Uma característica de tudo quanto é criatura é que não pode permanecer existindo em virtude do seu poder inerente. O fundamento do seu ser e da continuidade da sua existência é a vontade do seu Criador. Somente Aquele que criou o mundo pela palavra do Seu poder, pode sustentá-lo por Sua onipotência.
2. O CORRETO CONCEITO DA PRESERVAÇÃO DIVINA. A doutrina da preservação parte do pressuposto de que todas as substâncias criadas, quer espirituais quer materiais, têm existência real e permanente, distinta da existência de Deus, e só possuem propriedades ativas e passivas derivadas de Deus; e de que os seus ativos têm eficiência real, e não meramente aparente, como causas secundárias, de modo que podem produzir os efeitos que lhe são próprios. Assim, a doutrina protege-se do panteísmo, com a sua idéia de uma criação contínua, que virtualmente, se nem sempre expressamente, nega a existência distinta do mundo e faz de Deus o único agente do universo. Mas não considera essas substâncias criadas como auto-existentes, desde que a auto-existência é propriedade exclusiva de Deus, e todas as criaturas têm o fundamento da sua existência continuada nele, e não em si mesmas. Daí, segue-se que continuam a existir, e não em virtude de um ato meramente negativo de Deus, mas em virtude do exercício positivo e contínuo do poder divino. O poder de Deus acionado para a sustentação de todas as coisas é tão positivo como o poder exercido na criação. A precisa natureza da Sua obra na sustentação de todas as coisas, tanto no ser como no agir é um mistério, embora se possa dizer que, em Suas operações providenciais, Ele se acomoda à natureza das Suas criaturas. Dizemos com Shedd: “No mundo material, Deus age imediatamente nas propriedades e leis materiais e por meio delas. A preservação jamais contra a criação. Deus não viola na providência o que estabeleceu na criação”. A preservação pode ser definida como a obra contínua de Deus pela qual Ele mantém as coisas que criou, juntamente com as propriedades e poderes de que as dotou.
3. CONCEITOS ERRÔNEOS DA PRESERVAÇÃO DIVINA. A natureza desta obra de Deus nem sempre é compreendida acertadamente. Há duas maneiras de vê-la que devem ser evitadas: (a) Que é puramente negativa. Segundo o deísmo, a preservação divina consiste nisto: que Deus não destrói a obra das Suas mãos. Em virtude da criação, Deus dotou a matéria de certas propriedades, colocou-a sob leis inalteráveis e depois a deixou mover-se por si mesma, independentemente de todo suporte ou direção de fora. Esta é uma representação irracional, irreligiosa e antibíblica. É irracional porque implica que Deus comunicou auto-subsistência à criatura, quando a auto-existência e auto-sustentação são propriedades incomunicáveis, que caracterizam unicamente o Criador. A criatura jamais pode ser auto-sustentadora, mas precisa ser mantida dia a dia pelo poder absoluto do Criador. Daí, não se exigiria um ato positivo de onipotência da parte de Deus para aniquilar existências criadas. Uma simples retirada de suporte naturalmente redundaria em destruição. – Este conceito é irreligioso porque afasta Deus para Tão longe da Sua criação que a comunhão com Ele vem a ser uma impossibilidade prática. A história atesta claramente o fato de que ele invariavelmente quer a morte da religião. – Também é antibíblico, visto que pretende colocar Deus totalmente fora da Sua criação, ao passo que a Bíblia nos ensina em muitas passagens que Ele não é somente transcendente, mas também é imanente nas obras das Suas mãos. (b) Que é uma criação contínua. O panteísmo descreve a preservação como uma criação contínua, de modo que as criaturas ou causas secundárias são entendidas como não tendo existência real ou contínua, mas como emanando em cada momento sucessivo daquele misterioso Absoluto que é a base oculta de todas as coisas. Alguns não panteístas tinham uma idéia parecida da preservação. Descartes lançou as bases para essa concepção, e Malebranche a levou para o mais distante extremo coerente com o teísmo. Até Jonathan Edwards a ensina incidentalmente em sua obra sobre o pecado Original, e assim, perigosamente, quase chega a ensinar panteísmo. Esse modo de entender a preservação não dá lugar às causa secundárias e, portanto, leva necessariamente ao panteísmo. É contrário às nossas intuições originais e necessárias, que nos asseguram que somos causas de ação reais e auto-determinantes e, conseqüentemente, agentes morais. Além disso, fere a raiz mesma da ação livre, da responsabilidade moral, do governo moral e, portanto, da própria religião. Alguns teólogos reformados (calvinistas) também empregam a expressão “criação contínua”, mas com isso não ensinam a errônea doutrina que estamos focalizando. Desejam simplesmente acentuar o fato de que o mundo é mantido pelo mesmo poder que o criou. Em vista do fato de que a expressão está sujeita a ser mal entendida, é melhor evitá-la.

(Teologia Sistemática – Louis Berkhof)

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