terça-feira, 1 de outubro de 2013

A igreja e o Reino de Deus

1. A IDÉIA DO REINO DE DEUS. O reino de Deus é primariamente um conceito escatológico. Na Escritura, a idéia fundamental do Reino não é a de um restaurado e teocrático reino de Deus em Cristo – essencialmente, um reino de Israel – como pretendem os premilenistas; tampouco é uma nova condição social dominada pelo Espírito de Cristo e realizada pelo homem, mediante meios externos como boas leis, a civilização, a educação, reformas sociais etc., como os modernistas querem que acreditemos. A idéia primordial do reino de Deus na Escritura é a do governo de Deus estabelecido e reconhecido nos corações dos pecadores pela poderosa influência regeneradora do Espírito Santo, assegurando-lhes as inestimáveis bênçãos da salvação – um governo que, em princípio, é realizado na terra, mas que não chegará à sua culminação antes do visível e glorioso retorno de Jesus Cristo. Sua realização atual é espiritual e invisível. Jesus se apossou deste conceito escatológico e lhe deu proeminência em Seus ensinos. Ele ensinou com clareza a realização espiritual atual e o caráter universal do Reino. Além disso, Ele próprio efetuou essa realização numa medida até então desconhecida e multiplicou grandemente as bênçãos atuais do Reino. Ao mesmo tempo, Ele ofereceu a bendita esperança da futura manifestação desse Reino em glória externa e com as perfeitas bênçãos da salvação.
2. CONCEPÇÕES HISTÓRICAS DO REINO. Para os chamados pais primitivos da igreja, o reino de Deus, o bem supremo, é considerado primariamente como uma entidade futura, a meta do presente desenvolvimento da igreja. Alguns deles o consideravam como o vindouro governo milenário do Messias, apesar de que a história não dá suporte às pretensões exageradas de alguns escritores premilenistas sobre o número deles. Agostinho via o Reino como uma realidade presente e identificada com a igreja. Para ele o Reino se identifica primordialmente com os piedosos e santos, isto é, com a igreja como uma comunidade de crentes; mas ele empregava algumas expressões que parecem indicar que também o via incorporado na igreja organizada episcopalmente. A Igreja Católica Romana identificava francamente o reino de Deus com a sua instituição hierárquica, mas os Reformadores recuperaram o conceito de que, nesta dispensação, ele se identifica. Com a igreja invisível. Sob a influencia de Kant, e principalmente de Ritschl, ele foi despojado do seu caráter religioso e veio a ser considerado como um reino ético de fins. Atualmente, muitas vezes é definido como um novo princípio introduzido na sociedade e destinado a transforma-la em todas as suas relações, ou como a organização moral da humanidade mediante ação decorrente da motivação do amor – o fim, último da criação.
3. O REINO DE DEUS E A IGREJA INVISÍVEL. Conquanto o reino de Deus e a igreja invisível sejam até certo ponto idênticos, não obstante deve-se fazer cuidadosa distinção entre eles. A condição de cidadão daquele e de membro desta é igualmente determinada pela regeneração. É impossível estar no reino de Seus sem estar na igreja como corpo místico de Jesus Cristo. Ao mesmo tempo, é possível distinguir entre o ponto de vista segundo o qual os crentes são chamados o Reino, e o ponto de vista segundo o qual eles são chamados a Igreja. Constituem um reino em sua relação com Deus em Cristo como o seu Governador, e uma igreja em sua separação do mundo na devoção a Deus, e em sua união orgânica uns com os outros. Como uma igreja, são chamados para serem instrumento de Deus no preparo do caminho para a ordem ideal de coisas e na introdução dessa ordem; e como um reino, representam a realização inicial da ordem ideal entre eles.
4. O REINO DE DEUS E A IGREJA VISÍVEL. Desde que os católicos romanos insistem indiscriminadamente na identificação do reino de Deus e a igreja, sua igreja reclama poder e jurisdição sobre todos os domínios da vida, como a ciência e as artes, o comércio e a indústria, como também sobre as organizações sociais e políticas. Este é um conceito completamente equivocado. Também é um engano defender, como alguns cristãos reformados (calvinistas) o fazem, em virtude de uma concepção errônea da igreja como organismo, que as associações escolares cristãs, as organizações voluntárias de jovens ou de adultos dedicadas ao estudo dos princípios cristãos e sua aplicação na vida, as uniões de trabalhadores cristãos e as organizações políticas cristãs são manifestações da igreja como organismo, porquanto isto as coloca outra vez debaixo do domínio da igreja visível e do governo direto dos seus oficiais. Naturalmente, isto não significa que a igreja não tem nenhuma responsabilidade com relação a tais organizações. Significa, porém, que elas são manifestações do reino de Deus, nas quais grupos de cristãos procuram aplicar os princípios do Reino a todas as esferas da vida. A igreja visível e o reino de Deus também podem ser identificados até certo ponto. Certamente se pode dizer que a igreja visível pertence ao Reino, faz parte do Reino e até constitui a mais importante incorporação visível das forças do Reino. Ela compartilha o caráter da igreja invisível (sendo ambas uma só) como meio para a realização do reino de Deus. Como a igreja visível, o Reino também participa das imperfeições às quais o mundo pecaminoso o expõe. Isto fica mais que evidente à luz das parábolas do trigo e o joio, e da rede. Na medida em que a igreja visível serve de instrumento para o estabelecimento e a extensão do Reino, naturalmente ela está subordinada a este como um meio para um fim. Pode-se dizer que o Reino é um conceito mais amplo que a igreja, porque objetiva nada menos que o domínio completo de todas as manifestações da vida. Ele representa o domínio de Deus em todas as esferas do esforço humano.
(Teologia Sistemática – Louis Bekhof. Pg. 569)

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