quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Relação da Santificação com Outros Estágios da Ordo Salutis

É de considerável importância ter correta concepção da relação que há entre a santificação e alguns dos outros estágios da obra de redenção.
1. COM A REGENERAÇÃO. Há aqui diferença e semelhança. A regeneração é completada de uma vez, pois o homem não pode ser mais ou menos regenerado; está vivo ou morto espiritualmente. A santificação é um processo que produz mudanças graduais, de sorte que é possível distinguir diferentes graus da santidade resultante. Daí, somos admoestados a aperfeiçoar a santidade, no temor do Senhor, 2 Co 7.1. O Catecismo de Heidelberg também pressupõe a existência de graus de santidade, quando declara que, mesmo “os homens mais santos, nesta existência, têm apenas um pequeno princípio desta obediência”. Ao mesmo tempo, a regeneração é o princípio da santificação. A obra de renovação, iniciada naquela, tem prosseguimento nesta, Fp 1.6. Diz Strong: “Ela (a santificação) se distingue da regeneração como o crescimento se distingue do nascimento, ou como o fortalecimento de uma santa disposição se distingue da comunicação original dela”.
2. COM A JUSTIFICAÇÃO. Na aliança da graça a justificação precede à santificação e lhe é básica. Na aliança das obras a ordem da justiça e da santidade é precisamente o inverso. Adão foi criado com uma santa disposição e inclinação para servir a Deus, mas, com base nesta santidade, ele tinha que se sair bem na prática da justiça para ter direito à vida eterna. A justificação é a base judicial da santificação. Deus tem direito de exigir de nós santidade no viver, mas, uma vez que não podemos ter bom êxito com esta santidade por nós mesmos, Ele gratuitamente a produz em nós, por intermédio do Espírito Santo, com base na justiça de Jesus Cristo, que nos é imputada na justificação. O próprio fato de que ela se baseia na justificação, na qual a livre graça de Deus sobressai com a máxima proeminência, exclui a idéia de que alguma vez possamos merecer alguma coisa na santificação. A idéia católica romana de que a justificação habilita o homem para praticar obras meritórias é contrária à Escritura. A justificação, como tal, não efetua mudança em nosso ser interior e, portanto, necessita da santificação como seu complemento. Não basta que o pecador tenha a posição de justo diante de Deus; é preciso também que ele seja santo em sua vida interior. Barth tem uma descrição bem incomum da relação entre a justificação e a santificação. Com o fim de evitar toda justiça própria, ele insiste em que as duas sejam sempre consideradas juntamente. Elas andam juntas e não devem se consideradas quantitativamente, como se uma seguisse a outra. A justificação não é um posto pelo qual a gente passa, um fato realizado em cuja base logo parte para a estrada principal da santificação. Não é um fato consumado que se possa ver olhando para trás com definida segurança, mas ocorre sempre de novo, toda vez que o homem chega ao ponto de completo desespero, e então vai de mãos dadas com a santificação. E, exatamente como o homem continua sendo pecador depois da justificação, assim continua sendo pecador na santificação; mesmo as suas melhores ações continuam sendo pecado. A santificação não gera uma disposição santa, e não purifica gradativamente o homem. Não lhe dá posse de alguma santidade pessoal, não faz dele um santo, mas o deixa pecador. A santificação passa a ser realmente um ato declarativo, como a justificação. McConnachie, intérprete de Barth que o vê com muita simpatia, diz: “Portanto, para Barth a justificação e a santificação são duas faces de um ato de Deus sobre os homens. A justificação é o perdão do pecador (justificatio impii), pelo qual Deus declara justo o pecador. A santificação é santificação do pecador (sanctificatio impii), pela qual Deus declara ‘santo’ o pecador”. Por mais louvável que seja o desejo de Barth de destruir todo vestígio de justiça das obras, certamente ele vai a um extremo destituído de fundamento, no qual virtualmente confunde a justificação com a santificação, denega a vida cristã e elimina a possibilidade de confiante segurança.
3. COM A FÉ. A fé causa mediata ou instrumental santificação, como também da justificação. Não merece a santificação, como tampouco a justificação, mas nos une a Cristo e nos mantém em contato com Aquele que é a Cabeça da nova humanidade, a fonte da nova vida em nós, e também da nossa progressiva santificação, através da operação do Espírito Santo. A consciência do fato de que a santificação se baseia na justificação e de que é impossível sobre qualquer outra base, e de que o constante exercício da fé é necessário para haver avanço no caminho da santidade, proteger-nos-á de toda justiça própria em nossa luta para progredir na vida piedosa e na santidade em nosso viver. Merece particular atenção aqui o fato de que, enquanto que mesmo a mais fraca fé serve de meio para uma justificação perfeita, o grau de santificação é proporcional ao vigor da fé cristã e à persistência com que se apega a Cristo.
(Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 537)

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