terça-feira, 1 de janeiro de 2013

A Doutrina da Ceia do Senhor na História

1. ANTES DA REFORMA. Já na era apostólica a celebração da Ceia do Senhor era acompanhada de agapae ou festas do amor, para as quais o povo trazia os ingredientes necessários, e que às vezes levavam a tristes abusos, 1 Co 11.20-22. No transcurso do tempo, as oferendas assim trazidas passaram a ser chamadas oblações e sacrifícios, e eram abençoadas pelo sacerdote com uma oração de ação de graças. Gradativamente esses nome foram sendo aplicados aos elementos da Ceia do Senhor, de modo que estes assumiram o caráter de um sacrifício apresentado pelo sacerdote, e a ação de graças veio a ser considerada como uma consagração daqueles elementos. Enquanto alguns dos chamados pais primitivos (Orígenes, Basílio, Gregório de Nazianzo) retinham a concepção simbólica ou espiritual do sacramento, outros (Cirilo, Gregório de Nyssa, Crisóstomo) afirmavam que a carne e o sangue de Cristo de algum modo se combinavam com o pão e o vinho no sacramento. Agostinho retardou por longo tempo o desenvolvimento realista da doutrina da Santa Ceia. Apesar de falar do pão e do vinho como o corpo e o sangue de Cristo, ele distinguia entre o sinal e a coisa significada, e não cria numa transformação da substância. Negava que os ímpios, mesmo recebendo os elementos, também recebessem o corpo, e acentuava o aspecto comemorativo da Ceia do Senhor.
Durante a Idade Média o conceito agostiniano aos poucos foi sendo substituído pela doutrina da transubstanciação. Ainda em 818 AD, Paschasius Radbertus já propusera formalmente esta doutrina, mas encontrara forte oposição da parte de Rabanus Maurus e Ratramnus. No século onze irrompeu de novo uma furiosa controvérsia sobre o assunto, entre Berenger de Tours e Lanfranc. Este fez a grosseira afirmação de que “o verdadeiro corpo de Cristo estava de fato nas mãos do sacerdote, e era partido e mastigado pelos dentes dos fiéis”. Esta concepção foi definida finalmente por Hildebert de Tours (1134) e designada como doutrina da transubstanciação. Foi adotada formalmente pelo quarto Concílio de Latrão, em 1215.
Muitas questões relacionadas com esta doutrina foram debatidas pelos escolásticos, como as referentes à duração da mudança do pão e do vinho no corpo e no sangue de Jesus Cristo, à maneira da presença de Cristo em ambos os elementos, à relação existente entre substância e acidente, à adoração da hóstia, etc. A formulação final da doutrina foi dada pelo Concílio de Trento e está registrada na Sessio XIII dos seus Decretos e Cânones. Oito capítulos e onze cânones lhe são dedicados. Só podemos mencionar os pontos mais importantes aqui: Jesus Cristo está verdadeira, real e substancialmente presente no santo sacramento. O fato de que Ele está assentado à destra de Deus não exclui a possibilidade da Sua presença substancial e sacramental em vários lugares simultaneamente. Pelas palavras de consagração, a substância do pão e do vinho é transformada no corpo e no sangue de Cristo. Cristo completo está presente sob cada espécie e sob cada partícula de uma e outra espécies. Cada pessoa que receber uma partícula da hóstia, receberá o Cristo completo. Ele está presente nos elementos até mesmo antes de serem recebidos pelos comungantes. Em vista desta presença, a adoração da hóstia é simplesmente natural. O sacramento efetua um “aumento da graça santificante, graças especiais atuais, a remissão dos pecados veniais, a preservação de pecado grave (mortal), e a confiante esperança da salvação eterna”.
2. DURANTE E APÓS A REFORMA. Os Reformadores, todos eles, rejeitaram a teoria sacrificial da Ceia do Senhor e a doutrina medieval da transubstanciação. Diferiam, porém, em sua positiva elaboração da doutrina escriturística da ceia do Senhor. Em oposição a Zwínglio, Lutero insistia na interpretação literal das palavras da instituição e na presença corporal de Cristo na Ceia do Senhor. Contudo, substituiu a doutrina da transubstanciação pela da consubstanciação, defendida exaustivamente por Occam em sua obra sobre o Sacramento do Altar (De Sacramento Altaris), e segundo a qual Cristo está “em, com e sob” os elementos. Zwínglio negava absolutamente a presença corporal de Cristo na Ceia do Senhor e dava interpretação figurada das palavras da instituição. Ele via primariamente no sacramento um ato de comemoração, embora não negasse que nele Cristo está espiritualmente presente à fé dos crentes.
Calvino defendia uma posição intermediária. Como Zwínglio, ele negava a presença corporal do Senhor no sacramento, mas em distinção de Zwínglio, insistia na presença real, ainda que espiritual, do Senhor na Ceia, na presença dele como uma fonte de virtude ou poder e eficácia.. além disso, em vez de acentuar a Ceia do Senhor como ato do homem (quer de comemoração quer de profissão), ele salientava o fato de que ela é, acima de tudo, a expressão de uma dádiva da graça de Deus ao homem, e só secundariamente uma refeição comemorativa e um ato de profissão. Para ele, como também para Lutero, era primordialmente um meio divinamente designado para o fortalecimento da fé. Os socinianos, os arminianos e os menonitas viam na Ceia do Senhor apenas um memorial, um ato de profissão e um meio para melhoramento moral. Sob a influência do racionalismo, este se tornou o conceito popular. Scheleiermacher acentuava o fato de que a Ceia do Senhor é o meio pelo qual a comunhão de vida com Cristo é preservada de maneira particularmente dinâmica no seio da igreja. Muitos dos teólogos “da Mediação”, embora pertencentes à igreja luterana, rejeitavam a doutrina da consubstanciação e aprovavam o conceito calvinista da presença espiritual de Cristo na Ceia do Senhor.
(Berkhof, L – Teologia Sistemática Pg650)

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